Por Iris Pacheco, da Página do MST
Na última terça-feira, (14/5),
representantes da comunidade quilombola Rio dos Macacos, localizada na
Bahia, foram recebidos pela Senadora Ana Rita (PT-ES), presidenta da
Comissão de Direitos Humanos do Senado (CMDH), para uma reunião.
Estiveram presentes também diversos
movimentos sociais, como MST, Movimento dos Atingidos por Barragens
(MAB), Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), Movimento Sem Teto da
Bahia (MSTB) e Movimento Camponês Popular (MCP).
Durante a reunião, a comunidade
apresentou uma pauta de reivindicações, que solicitam o fim das
violações dos Direitos Humanos, a agilidade no procedimento de titulação
do território quilombola e exigem a publicação imediata do Relatório
Técnico de Identificação e Delimitação (RTID) pelo Instituto Nacional de
Colonização na Reforma Agrária (Incra).
O Quilombo Rio dos Macacos é uma
comunidade negra rural, composta por 67 famílias descendentes de
escravos com história que remonta há mais de um século de existência.
Com a chegada da Marinha do Brasil entre as décadas de 50 e 60, que
recebeu a área como doação indevida da Prefeitura Municipal de Salvador e
construiu uma barragem e a Vila Militar.
Desde então, a comunidade quilombola
se vê sob uma dinâmica social composta de restrições e práticas
abusivas, no sentido de coibir os moradores na construção ou reforma de
suas casas, bem como na manutenção dos roçados de subsistência e
violações de direitos básicos que garantem uma vida digna como educação,
saúde, infraestrutura, saneamento básico, entre outros.
A moradora do Quilombo Rosimeire dos
Santos relata as condições subumanas em que a comunidade vive. “A gente
vive na senzala, corrente e tronco. Ainda somos escravos. A comunidade
quilombola não troca, não vende, não negocia, fazer isso seria negociar
nossas vidas. Precisamos urgentemente que nossos direitos sejam
respeitados e aplicados, pois sabemos que existem os órgãos
responsáveis, mas não sabemos o que é. A gente não sabe o que é
justiça”, disse.
A comunidade solicita uma audiência
com o ministro do Desenvolvimento Agrário Pepe Vargas e a presidenta
Dilma Rousseff, que já tem conhecimento do caso. “O pedido do Quilombo
Rio dos Macacos é que a gente se reúna com a presidenta Dilma, porque
demos a ela um voto de confiança. Queremos ajuda não só para o Quilombo,
mas também para outras comunidades quilombolas que também estão na
mesma situação”, diz Rosimeire.
De acordo a Fundação Cultural
Palmares, no Brasil existem apenas 1.826 comunidades remanescentes de
quilombos auto reconhecidas e certificadas pela instituição. Na Bahia
são 438, porém pouco mais da metade foram titularizadas, como garante o
artigo 68 da Constituição Federal.
Dona Olinda Souza de Oliveira,
também residente no Quilombo, retrata o atual descaso a que estão
submetidos, “vivemos em um Estado de direitos que a gente não consegue
entender qual direito temos. Carregamos na pele a marca da violência da
Marinha do Brasil contra nós, e não somos os únicos, vários outros
quilombos, como a gente, estão pedindo socorro”, desabafa.
Os diversos povos brasileiros tem
sofrido um retrocesso na garantia dos direitos assegurados na
Constituição. José Rosalvo, residente do Quilombo, comentou que “nós do
Quilombo ainda vivemos sob as incidências da violência.
Não temos cobertura de nenhum órgão
em função de garantir nossos direitos. Não chegou essa condição de
direitos à comunidade, a gente ainda vive na miséria”, ressaltou.
Estiveram presentes na reunião o
deputado Luís Alberto (PT-BA) que enfatizou a intransigência do juíz
responsável pelo caso e reforçou que o Estado tem que garantir seu papel
constitucional de assegurar os direitos do povo quilombola como
determina a Constituição.
“O caso do Quilombo Rio dos Macacos é
emblemático, pois as condições de vida são subumanas. Peço à casa que
se agregue à luta desigual, pois há uma discussão em vários setores do
governo, e não há uma posição sobre qual encaminhamento a se tomar. Não
queremos ter um pinheirinho na Bahia”, destacou.
A Senadora Lídice da Mata (PSB-BA)
comentou sobre importância da unidade dos movimentos populares e a
obrigação dos parlamentares dentro do senado em fazer ecoar a voz do
povo no Congresso.
A senadora afirmou também o
compromisso ideológico com os Direitos Humanos no país. “Tenho convicção
que a luta do Quilombo Rio dos Macacos será abraçada pela CMDH e outros
parlamentares e partidos políticos aqui no senado” afirmou.
A secretária de políticas de
promoção da igualdade racial (SEPPIR), Silvany Euclênio, disse que o
Congresso vive um momento crucial de retrocesso das políticas públicas, e
que é necessária que uma decisão política seja tomada a partir da união
de diversos poderes para que haja uma solução adequada para as ambas as
partes, porque a situação já é bastante insustentável.
Encaminhamentos
Da reunião saíram algumas medidas
emergenciais para serem encaminhadas. A CMDH se comprometeu em dialogar
com o governo do estado da Bahia para dar ajuda humanitária em termos
alimentares.
Além de marcar uma reunião com o
Ministro Pepe Vargas, Ministério de Desenvolvimento Social (MDS),
Ministério da Defesa (MD), Secretaria de Direitos Humanos (SDH),
Ministério da Igualdade Racial (MIR), Incra e demais órgãos que tem
interface com as questões relacionadas ao caso, principalmente com a
violação aos Direitos Humanos.
A Senadora Ana Rita anunciou ainda
que “A CMDH abraça, acolhe a causa do Quilombo e vamos nos somar a
outras pessoas, entidades, para ajudar a resolver o conflito” e que irá
propor aos seus membros uma visita à comunidade, após os encaminhamentos
das questões emergenciais necessárias.
Processo judicial
Desde agosto de 2012, o Incra
concluiu o Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID), que
aponta que os quilombolas descendem de escravos de fazendas que
produziam cana-de-açúcar para o Engenho de Aratu, no período colonial.
Ao longo do tempo, as famílias de descendentes desses escravos se
fixaram no local. No entanto, até o presente momento o RTID não foi
publicado no Diário oficial da União.
Durante a reunião com a Senadora, O
advogado Maurício Correia, da Associação dos Advogados dos Trabalhadores
Rurais da Bahia (AATR), que tem prestado assistência jurídica à
comunidade, solicitou a publicação imediata do RTID, uma vez que a
proposta de resolução do problema, realocando as famílias para um local
de apenas 21 hectares, não condiz com as necessidades de vida objetivas
da comunidade.
Em setembro de 2011 a Comunidade
entrou na estatística de mais um remanescente de quilombo, reconhecido
pela Fundação Cultural Palmares. Além da comunidade vivenciar
cotidianamente as violações de Direitos Humanos, o Quilombo Rio dos
Macacos está sob a ameaça de ser expulso do seu território tradicional
em razão de três ações reivindicatórias ajuizadas pela União Federal
contra a referida comunidade, em que qualifica os Réus como “invasores” e
solicita a desocupação do imóvel.
As terras ocupadas pelo quilombo
encontram-se na divisa dos municípios Salvador e Simões Filho. A
fronteira entre um e outro município é dada pelo mesmo Rio dos Macacos
de que a comunidade empresta o nome.
De acordo o censo de 2010, realizado
pelo IBGE, o município de Simões Filho possui uma área de 201,222 km²,
com uma população de 118.047 habitantes, dos quais 88,6% residem em área
urbana e apenas 10,4% em área rural.
A comunidade faz parte dessa pequena
porcentagem rural, e ocupa um território de 301 hectares. Mesmo estando
próximo a área urbana, seus costumes e cultura são referencialmente
rurais.
O advogado Correia comenta que
existe uma intransigência jurídica com relação ao caso. “A petição diz
que os quilombolas são invasores da área militar e cometem crime
ambiental.
No entanto, todos esses casos são
falácias da Marinha, pois não há nenhuma prática de crime ambiental no
local. O que existe é uma comunidade que resiste a mais de 150 anos a
indústrias, usinas, fazendas e agora à Marinha”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário